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Número 18 - Abril 2006

Espelho do tempo: o Eu e o Outro de Jorge Luis Borges

Natalia Alves Barbieri
manaca_ba@uol.com.br - nabarbieri@ig.com.br

Resumo: Este trabalho pretende discutir uma questão inerente à vivência da temporalidade para o humano: o que permanece no ser com o passar dos anos? O conto "O outro" escrito em 1969, por Jorge Luis Borges, onde o autor relata seu encontro com ele mesmo mais jovem, será a sustentação poética para os assuntos discutidos. Tem o objetivo de contribuir com uma visão da psicanálise que entende o envelhecimento como processo, como constante percurso do sujeito no seu encontro com o outro. O que permanece no sujeito no decorrer da vida, pode ser compreendido como aquilo que continua sendo investido no cotidiano, que se configura na relação com o mundo, com as coisas, com as pessoas e consigo próprio. Também se discute a necessidade do sujeito de permanecer, promover a continuidade de si, de estar presente no mundo depois da morte, como uma maneira de diminuir a angústia frente ao fim inevitável.

Palavras-chave: tempo, envelhecimento, psicanálise, literatura.

Resumen: Este trabajo pretende discutir una cuestión inherente a la vivencia de la temporalidad para el humano: ¿Que es lo que permanece en el ser con el pasar de los años? El cuento "El otro" escrito en 1969 por Jorge Luis Borges, donde el autor relata su encuentro con el mismo más joven, será a el suporte poético para los asuntos discutidos. Tiene el objetivo de contribuir con una mirada del psicoanálisis que entiende el envejecimiento como proceso, como constante precurso del sujeto en su encuentro con el otro. Lo que permanece en el sujeto en el decorrer de la vida, puede ser comprendido como aquello que siegue siendo investido en el cotidiano, que se configura en la relación con el mundo, con las cosas, con las personas e consigo mismo. También se discute la necesidad del sujeto permanecer, promover su continuidad si, de estar presente en el mundo después de la muerte como una manera de disminuir la angustia ante el fin inevitable.

Palabras-clave: tiempo, envejecimiento, psicoanálisis, literatura.

Perplexidade e estranhamento marcam o encontro fictício entre Jorge Luis Borges e ele mesmo, cinqüenta anos mais novo, no conto "O outro". Este inusitado acontecimento será a sustentação poética para os assuntos, que aqui organizados, refletem discussões e estudos que ora realizamos no grupo de interlocução entre psicanálise e envelhecimento 1.

Este conto já foi alvo de diversas análises psicológicas e filosóficas no mundo acadêmico. Na pesquisa realizada para fundamentar este trabalho, foram encontrados diversos textos teóricos a respeito da obra de Borges, inclusive duas teses de doutorado 2. A temática tratada nestes estudos é recorrente na obra do autor e versa sobre o sonho e a realidade, a alteridade e o estrangeirismo, a questão do duplo, do mesmo e do outro. Como bem define Bartucci (1996), que tem um largo e consistente trabalho sobre Borges e a psicanálise, "a idéia de que todo homem é também outro homem, ou mesmo todos os homens, permeia a maior parte de suas obras" (p. 50). O que chamo a atenção para este texto, no entanto, é a questão colocada sobre a temporalidade: são dois Borges, com idades de 17 e 70 anos, que tentam com resistência se reconhecerem um no outro, apesar de serem o mesmo, apenas em idades diferentes. Por se tratar de uma obra complexa e amplamente estudada, não há pretensão de discorrer sobre aspectos literários ou sobre correlações entre o autor e sua obra. O presente trabalho pretende contribuir com uma visão da psicanálise, que entende o envelhecimento enquanto processo, enquanto constante percurso do sujeito no seu encontro com o outro.

O conceito de envelhecimento que sustenta este trabalho está vinculado à idéia da vivência do tempo pensada a partir das noções de temporalidade cronológica e kairótica. Ou seja, da relação do tempo externo medido pelas convenções sociais nomeadas por minutos, horas, dias; e do tempo interno provindo da experiência vivida, daquilo que é de mais pessoal para cada sujeito. Kairós, segundo os gregos (Pompéia, 2004), contém também uma dimensão do tempo que abre para a oportunidade, para alguma ocasião onde as possibilidades se encontram à disposição. O tempo não é, portanto, algo de fora que determina a vida dos seres, assim como o tempo não existe em si mesmo, como diz Martins (1998) "O homem não está no tempo é o tempo que está no homem" (p.10). Ele existe em relação com o sujeito, existe-se no tempo, se é sendo no tempo. Não é o tempo que passa, mas passamos com ele, cada qual edificando sua própria história e contribuindo para a criação e manutenção da cultura. Somos seres mortais e finitos, e é neste embate constante, com aquilo que nos define de forma inexorável, que vamos nos configurando enquanto sujeitos na relação com o outro.

Esta abordagem da temporalidade se diferencia de algumas teorias do desenvolvimento mental e de personalidade, muito influentes na sociedade ocidental, na qual a vida é entendida como uma seqüência de fases a serem ultrapassadas. A maturidade é o tesouro escondido no fim do caminho e somente aqueles que percorrerem com afinco os trancos da vida poderão chegar ao cume desta montanha. De acordo com esta lógica, a vida é entendida como uma sucessão de momentos, que vividos progressivamente, levam a um fim a ser alcançado, numa linha evolutiva. Manter uma distância desta lógica de pensamento implica num abandono de datas pré-determinadas ou de limites que marcam a entrada nesta ou naquela fase do desenvolvimento, que pode ser usado como pretexto para discriminar ou enquadrar o sujeito dentro de uma pretensa normalidade. No entanto, não nos exime do esforço em considerar as particularidades que ocorrem nos diferentes momentos da vida.

A entrada na velhice é um aspecto que demonstra esta complexidade. Não podemos definir cronologicamente quando alguém passa a ser considerado velho ou passa a se considerar velho, mesmo com a convenção social que demarca esta fronteira aos 60 anos de idade3. Alguns autores que trabalham com o tema irão propor uma diferenciação entre os conceitos de velhice e de envelhecimento, ampliando assim o olhar para o assunto; Messy (1992) nos esclarece: O envelhecim ento não é a velhice, como uma imagem não se reduz a uma etapa. O envelhecimento é um processo irreversível, que se inscreve no tempo. Começa com o nascimento e acaba na destruição do indivíduo. (...) Se o envelhecimento é o tempo da idade que avança, a velhice é o da idade avançada, entende-se, em direção à morte"(p.12). O conceito de envelhecimento não é encarado, portanto, como a última etapa de um processo, mas algo que ocorre a todo instante. Na velhice esta vivência diferencia-se das outras épocas da vida, pois o sujeito velho vive o imperativo do tempo da finitude.

A psicanálise trabalha com a idéia de que a libido e o desejo permanecem no sujeito com suas vicissitudes até o momento da morte, assim como o tempo do inconsciente também não é o cronológico. Goldfarb (2004) assinala que a psicanálise quebra esta idéia de tempo linear ou circular, ao provocar a existência de outros tempos: o tempo de repetição, de transferência, de posterioridade, de elaboração, de transformação e de construção de subjetividade. O tempo da memória, o tempo da lembrança e o tempo mesmo do acontecimento também serão de outra ordem 4. O sujeito está em jogo no tempo, está em jogo na ordem simbólica balizada pela cultura em que vive, está em constante movimento, movimento sustentado pelo discurso social que, sem oferecer certezas, garante alguma promessa de futuro para os tortos caminhos dos desejos.

***

O conto "O outro", que faz parte do Livro de areia, escrito em 1969, tem como autor um Borges com 70 anos, praticamente cego, que apesar deste sentido em falta continuou a escrever até o fim da vida. Dentro de um universo fantástico ficcional, característica literária que tornaria o autor uma referência na literatura mundial, este conto é narrado em primeira pessoa do singular e relata o encontro do Borges de 70 anos com ele mesmo jovem (próximo da idade de 20 anos)5. Momento marcado pelo que ele denomina de "atrocidade", ele diz: "Meu primeiro propósito foi esquecê-lo para não perder a razão". Em diversas situações contextualiza o leitor dos vários tempos e locais onde se deu o acontecimento. O fato, se é que podemos pensar nestes termos, se passa em espaço e tempo diferentes para cada um dos Borges - o velho se encontra em Cambridge em 1969, e o outro diz que está em Genebra em 1914. As cidades diferentes mesclam-se num mesmo cenário: o rio, o prédio, o banco - as especificidades de cada uma não as discriminam enquanto locais diferentes. O rio é tratado como alegoria irônica do que está acontecendo: o rio de Heráclito faz alusão direta à máxima de que não entramos no mesmo rio duas vezes, e aqui remete novamente a idéia do tempo enquanto um processo irreversível.

Num outro trecho do conto refere-se novamente a esta imagem ao trazer a frase: "o homem de ontem não é o homem de hoje". O fato de um rio manter-se rio, enquanto perpetua-se o caminho das águas, indica que a repetição é da matéria água e não da mesma água, e nem do mesmo percurso, já que o próprio movimento juntamente com as interferências do ambiente e do humano altera o seu curso constantemente. O que se repete parece não ser sempre o mesmo, mas o que, por sua vez, precisa se repetir a todo o micro instante para que um ser continue a se reconhecer enquanto tal?

Assim que o Borges jovem senta-se no mesmo banco, a situação é vivida com espanto e desconforto; por não querer parecer descortês, Borges velho permanece sentado apesar de preferir manter-se só com seus pensamentos. Reconhece o outro pela familiaridade de uma música assoviada e pela entonação da voz; esta memória lhe faz retroceder a uma rede de outras lembranças que de alguma maneira estavam associadas ao som emitido. O velho tenta se aproximar após constatar serem a mesma pessoa. O jovem descrê e depois de certa relutância se diferencia fisicamente de seu outro dizendo: "o estranho é que nos parecemos, mas o senhor é muito mais velho, com cabeça grisalha".

Para provar que ambos se tratavam do mesmo, Borges velho resgata coisas existentes em sua casa na época, descreve objetos de cunho extremamente pessoal (com histórico familiar), dando a entender que nestes ressoam conteúdos emocionais significativos, de modo que somente eles poderiam identificar, pois permaneceram por fazerem parte de alguma vivência e não somente por terem existido por si.

Esta tentativa não é eficiente a ponto do jovem acreditar na possibilidade de tal encontro, onde se evidencia o confronto entre sonho e realidade. Porém, demonstra medo ao imaginar que o sonho, se este assim o for, perdure. Borges velho neste momento relata fingir uma certa serenidade que não sentia. É comum na juventude em nossa cultura projetar no velho a calmaria, a serenidade, a sabedoria, enfim, a maturidade almejada, isto porque a ansiedade é toda presença principalmente neste momento da vida, e anseia-se (espera-se) que um dia ela vá embora.

O velho pergunta se o outro quer saber do futuro, propondo relatar seu próprio passado, pois o velho diz que seu sonho já durou 70 anos e que "ao rememorar não há pessoa que não se encontre consigo mesma". O jovem assente sem dizer palavra e depois de um tempo Borges velho pensa: "Notei que mal me prestava atenção. O medo elementar do impossível, e no entanto certo, o aterrorizava. Eu que não fui pai, senti por esse pobre moço, mais intimo que um filho da minha carne, uma onda de amor". O velho narra o que viveu, diz sobre um processo marcado pelo referencial da atualidade. O jovem parece não se interessar pelo seu futuro, parece não fazer sentido sabê-lo, a possibilidade é ao mesmo tempo intrigante e amedrontadora: Édipo não conseguiu evitar seu destino trágico mesmo ao tentar controlar suas ações após o inevitável anunciado.

Saber o futuro implica, neste caso, conhecer a história de um outro desconhecido; da também velhice anunciada. Olhar para o passado, como sabemos, estará sempre marcado pela perspectiva do presente, por este eu que não é o mesmo de antes e que reconta sua história no momento em que reedita seu passado esperançando um passado de futuro melhor, é sempre uma leitura desta perspectiva atual e ao mesmo tempo momentânea. Nas palavras de Merleau-Ponty, "quando evoco um passado longínquo, reabro o tempo, recolo-me num momento em que ele ainda comportava um horizonte de futuro. Hoje fechado, um horizonte de passado próximo, hoje longínquo" (p. 419). O anseio de futuro, como expõe Goldfarb (2004), deve representar a possibilidade do reencontro de um passado e trazer a promessa desse reencontro na posterioridade.

O velho diz "ao rememorar não há pessoa que não se encontre consigo mesma". Se anteriormente Borges diz "o homem de ontem não é o homem de hoje", neste trecho a perspectiva temporal é outra, diz algo daquilo que permanece enquanto memória e como tal permite um encontro de si consigo mesmo. O interlocutor deste encontro é o eu. Este eu se caracteriza por se constituir na relação com o outro e na relação com a temporalidade que o delimita. Por isso, o sentido do tempo só existe para nós porque somos seres temporais. Disto retiramos dois aspectos do eu que nos interessam: aquilo que permanece no eu durante o passar dos anos (que podemos chamar aqui de identidade no sentido daquilo que faz com que o eu se identifique como eu dia após dia), e o imperativo de continuidade do eu. O sentimento de amor de Borges velho pelo jovem citado acima, pode ser entendido como uma necessidade de deixar a própria história como herança para alguém que a manterá viva. Necessidade de continuar presente no mundo após a própria morte.

No conto há o movimento de distanciamento e diferenciação entre as duas personagens, mesmo com a insistência do velho na busca pela semelhança, ainda que ela pareça pouca. O sentimento de estranheza deste encontro dá-nos a impressão que são duas pessoas diferentes, cada qual com sua história. Ambos se estranham, um é desconhecido do outro e isto chega a ser apavorante. Para Sarti (2004), "o confronto com o estranho põe em questão as certezas sobre si mesmo. A diferença é ameaçadora porque fere a própria identidade" (p. 88). Bartucci (1996) sugere que o encontro entre o familiar e o estrangeiro, na experiência frente ao desconhecido exige um reexame de nós mesmos, e não há como sair inócuo desta colisão.

O reconhecimento entre os Borges acontece quando a literatura torna-se tema presente. Só podem se entender frente às "referências livrescas".

O fotógrafo alemão Michael Wesely, autor das fotos acima 6, trabalha com imagens de cidades onde há uma circulação muito grande de pessoas, e assim como este conto de Borges, coloca em evidencia a questão sobre aquilo que permanece com o passar do tempo. Ele faz fotografias de partes movimentadas da cidade durante o horário do rush, de obras em construção que duram meses. Com o intuito de fazem uma relativização da percepção do tempo, daquilo que permanece imóvel, deixa o filme em exposição com pouca entrada de luz para poder captar o que acontece durante horas, dias e até meses de uma determinada situação. As fotos impressionam, pois esta técnica faz com que os eventos passageiros sejam registrados de modo sutis, quase imperceptíveis. Não há pessoas nas fotografias, mas sim o que se entende como um possível traçado de percursos. Não se sabe o ocorreu ali, sabe-se que aconteceu algo, mas nada pode ser dito sobre os rumos de quem passou naquela rua. O que permaneceu gravado foi o vulto daquilo que não conseguimos agarrar no nosso cotidiano, aquilo que não fica disponível para averiguação: o movimento. A psicanálise lida também com o efêmero, com pequenas apreensões do acontecimento, e se pensarmos na neurose, pode-se dizer que trabalhamos com o que está encurralado, limitado, enredado por ela.

Paradoxalmente, a imagem dos vultos das fotografias nos remete àquilo que estava em movimento. Os próprios edifícios das imagens, também estão sujeitos à degradação; sofrer ação no tempo decorre do estar presente e disponível ao encontro e ao uso. Mesmo a permanência das coisas concretas é passível de questionamento, porque suas relações com a realidade estão fundamentadas pela utilidade. Merleau-Ponty (1971) esclarece esta questão ao tratar da relação humana com as coisas do mundo: "Não tenho absolutamente um mundo físico, não vivo somente no meio da terra, do ar e da água, tenho em volta de mim estradas, plantações, cidades, ruas, igrejas, utensílios, uma campainha, uma colher, um cachimbo. Cada um desses objetos tem no fundo a marca da ação humana à qual serve. Cada um emite uma atmosfera de humanidade que pode ser muito pouco determinada, se só se trata de alguns traços de passos na areia, ou, pelo contrário, muito determinada, se visito de cabo a rabo uma casa recentemente esvaziada" (p.351). Se não fizerem sentido como utilidades, deixam de existir ou ficam abandonadas. Will Eisner em "Uma história sobre a vida e morte de um edifício" relata seu assombro frente às mudanças inevitáveis que acompanhou em sua cidade: "enquanto eu crescia em meio à turbulência da vida urbana, era preciso apenas um estado de alerta superficial para enfrentar o ritmo das mudanças e experiências que se desenrolavam. Havia pouco tempo para questionar a rápida substituição de pessoas e de edifícios. Tais coisas deviam ser aceitas como normais. À medida que fui envelhecendo e acumulando recordações, passei a me sensibilizar mais e mais com o desaparecimento de pessoas e referências urbanas. Para mim, eram especialmente perturbadoras as inexplicáveis demolições de prédios". Não podemos esquecer que aquilo que entendemos como da ordem da concretude, sofre ação no tempo, sofre ação humana e traz implicações para todos que estão à volta.

O que está sendo só pára quando se morre. Até o ultimo fio de ar implica numa relação com os outros; nos últimos momentos de um processo de demência, o que resta é o corpo, que mesmo inerte enquanto respira, implica em relação com o mundo e com os outros. Não podemos, no entanto, cair no possível engodo de pensar que aquilo que permanece é algo que está cristalizado ou fixo, pois tanto o corpo quanto os prédios da foto se modificam.

Se nas fotos de Wesely, o registro do tempo se deu pela arquitetura que permanece imóvel na cidade (e não pelo movimento humano cotidiano), o que permaneceu enquanto possibilidade de identificação entre Borges velho e Borges novo, tão díspares em relação um com o outro, foi a literatura. No conto, apresentam-se dois sujeitos apesar de serem um mesmo, a vida letrada é a ponte de conexão entre estas duas histórias. O que une, foi aquilo que permaneceu por ter sido investido É interessante pensar que as "referências livrescas" aparecem aqui como algo do concreto, assim como as edificações das fotos de Wesely. Ficaram como marca deste processo por terem sido investidas durante a vida. O que se manteve decorre do desejo de se alcançar o aconchego anterior da possível completude; esperasse, como diria Paulo Freire 7, a todo o instante, a possibilidade de aumentar a satisfação do acalanto do colo. O esperançar está na ordem do dia, pois é assim que o eu garante a sensação de continuidade e, portanto, da manutenção e da permanência daquilo que se pressupõe como eu e que pode ser confirmado pela presença do outro.

Notas

1 Grupo criado inicialmente para o encontro dos Estados Gerais de Psicanálise em 2001, coordenado por Delia Catullo Goldfarb.

2 GUEDES, Rita Correia. Borges e o outro. Tese de doutorado apresentada na Faculdade de filosofia, letras e ciências humanas da USP/SP. Orientação Antônio Cândido, 1976.

FIGUEIREDO, Luis Antônio de. Edgar Allan Poe, o outro & o mesmo de Jorge Luis Borges. Tese de doutorado apresentada na Faculdade de ciências humanas e letras da UNESP/Assis, 1988.

3 A Organização Mundial da Saúde (OMS) define a entrada na velhice a partir dos 60 anos. A legislação brasileira que dispõe sobre a política nacional do idoso, a lei no 8.842 no seu artigo 2o, também considera como idoso "a pessoa maior de sessenta anos de idade".

4 Goldfarb (2004) continua: "o inconsciente, tal como entendido por Freud, não é atemporal, é uma história que não se reconhece como tal. Não está fora do tempo, mas é regido por um outro tempo que, no presente constante de suas diferentes inscrições, rechaça o tempo do consciente, do secundário e se impõe como repetição. Então podemos pensar em um registro inconsciente ligado ao prazer primário, um movimento em procura de um prazer originário ao qual o eu ideal não pode renunciar. Há ainda um outro tempo, o tempo dos processos secundários, que guardam uma promessa de futuro, tempo de construção de tentativas e caminhos na vã esperança de restituição do ideal absoluto" (p.116).

5 Borges foi ter como referência para esta temática o texto Willian Wilson de Edgar Allan Poe, o encontro macabro entre dois seres que apesar de diferentes são a mesma pessoa, só que aqui se encontram com a mesma idade. O encontro com o outro pode ser lido como o encontro com o mesmo, já que o eu se constituirá por este olhar externo que o constitui. A imagem refletida no espelho é a de si e ao mesmo tempo de um outro externo (Bartucci 1996).

Referências bibliográficas

BARTUCCI, G. Borges: A realidade da construção. Rio de janeiro: Imago Editora, 1996.

BORGES, J.L. O outro. In O livro de areia. São Paulo: Editora Globo, 1975.

EISNER, W. O edifício. São Paulo: Editora Abril, 1989.

GOLDFARB, D.C. Corpo, tempo e envelhecimento. São Paulo: Casa do psicólogo, 1998.

GOLDFARB, D.C. Demências. São Paulo: Casa do psicólogo, 2004.

MARTINS, J. "Não somos cronos, somos kairós". Palestra proferida no evento: Ser e Tempo, a universidade e o envelhecer - In Revista Kairós gerontologia, (1) 11-24, n.1. São Paulo: EDUC, 1998.

MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da percepção. São Paulo: Livraria Freitas Bastos S.A., 1971.

MESSY, J. A pessoa idosa não existe. São Paulo: Editora ALEPH, 1992.

POMPÉIA, J. A. & SAPIENZA, B.T. O tempo da maturidade in Na presença do sentido. São Paulo: EDUC; Paulus, 2004.

SARTI, C. A. A família como ordem simbólica. São Paulo: Revista Psicologia USP, 15(3), 2004.

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