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teórico conceptuales
A pulsão e seus objetos
Mariana
Zelis
marianazelis@terra.com.br
Este trabalho articula às temáticas da pesquisa apresentada nas jornadas do ano passado.
Partimos novamente do conceito de pulsão sob um aspecto que Freud denominou como de mais radical, a pulsão de morte. Lacan também enfatiza e privilegia esta pulsão dizendo que "toda pulsão é virtualmente pulsão de morte" (1), "a pulsão, a pulsão parcial, é fundamentalmente pulsão de morte, e representa em si mesma à parte da morte no vivo sexuado" (2).
O corpo pulsional exige um trabalho continuo, é uma força constante que impulsiona a contornar seus objetos na procura de satisfação; desde este ponto de vista poderíamos falar de pulsão de vida, movimento, procura, mas se existe um Além do princípio do prazer, poder-se-ia pensar na pulsão de morte como vida? Que vida seria esta? Vida para quem? Ao falar de morte em psicanálise , a que morte se refere?
Diferenciamos, seguindo Garcia Roza, a morte como limite póstumo do discurso e da experiência humana, da pulsão de morte em quanto compulsão à repetição, como limitação do principio do prazer em quanto homeostase.E seguindo a Lacan diremos que o significante mortifica, fragmenta, mata a vida enquanto gozo.
Para Freud em "O Estranho", a repetição involuntária do mesmo era o retorno do mais familiar que reprimido retornava como estranho, sinistro,causando horror.
Mas o que retorna? O que tem se tornado estranho sendo familiar? Deixaremos estas questões para tentar respondê-las a partir de Lacan.
Para Freud a dominância da energia livre é associada á pulsão de morte, sendo esta pura dispersão, ausência de ordem, inexistência de ligações. Compara- a, Garcia Roza, a um fundo silencioso, de puro caos-acaso indiferenciado, onde as pulsões de vida através das ligações (energia ligada) estabeleceriam uma certa ordem, seria a pulsão capturada pela subjetividade, nesta perspectiva tanto para Freud como para Lacan à pulsão de morte seria a pulsão por excelência.
Qual a relação com a vida enquanto corpo pulsional que através de seus circuitos sempre se satisfaz?
Falaremos sobre o sujeito. Segundo Lacan o sujeito não é causa sui,(sua própria causa) ele é o resultado das operações de causação do sujeito, é produzido, algo opera sobre ele para surgir logo da alienação e da separação.
A operação de alienação produzirá a divisão do sujeito, emergência do inconsciente a partir do significante que produz uma perda estruturante, impossível de restituir.
O sujeito "por nascer com o significante, o sujeito nasce dividido..., justo antes, como sujeito, não era nada, mas que, apenas aparecido, se coagula em significante" (3)
Neste primeiro momento de alienação presentifica-se a mortificação significante.
..."Passemos à segunda operação, onde se fecha a causação do sujeito, para nela constatar a estrutura de borda em sua função de limite, bem como na torção que motiva a invasão do inconsciente"...(4) È portanto a divisão do sujeito e "a retirada da falta pela falta, através da qual o sujeito reencontra no desejo do Outro sua equivalência ao que ele é como sujeito do inconsciente" (5)
"Ao situar-se nos pontos de falta do Outro, o sujeito poderá " jogar sua partida"e liberar- se do efeito afanistico do significante" (6) Existe aqui uma separação do Outro, onde há uma relação de falta à falta fora da cadeia significante. "Nesse mesmo lugar, se inscreve o objeto a, no lugar da falta, do vazio. O objeto então é feito-efeito dessas duas faltas...vem recobrir as faltas como envelopes ou emblemas." (7)
Termina assim a "circularidade da relação do sujeito ao Outro".(8)
Neste ponto é importante salientar a via privilegiada do significante e da lógica que Lacan utiliza para o sujeito, constatando-se a primazia da pulsão de morte, como a parte de morte no vivo sexuado. Efeito de mortificação sobre o corpo, anulando o gozo. E a vida? Neste ponto, respondendo à questão precedente, o mito lacaniano da Lamela, em relação direta com a pulsão, vem a ilustrar e a representar à libido como órgão do real, como superfície que ordena um campo de forças, apoiada numa borda fechada ou zona erógena. Introduz assim um campo de vida, pulsional, para o sujeito. O mito sintetizado, diz, "Cada vez que se rompem as membranas, pela mesma saída um fantasma levanta vôo, aquele de uma forma infinitamente mais primária da vida...conduzida pelo puro instinto de vida, imortal por ser cissípara...sendo aqui representada por um ser mortífero, ela marca a relação, da qual o sujeito participa, entre a sexualidade, especificada no individuo, e sua morte" (9)
É através da incidência da linguajem que a pulsão emerge como representante da sexualidade no inconsciente, pulsão sempre parcial. A questão central na separação, a pergunta, o que sou eu no desejo do Outro? Não é respondida via o Outro onde encontramos só significantes e vazio (intervalo significante), não é via alienação significante do sujeito, quem responde então? É o ser, a libido, o gozo representado no mito da lamela.
"É no Seminário A angustia que o gozo se libera da armação significante, de sua prisão fálica, sendo os objetos a os que dão corpo ao gozo, tipos de órgãos, corpos de gozo, pedaços de real" (10), restos da operação subjetiva. Neste seminário os objetos a, são pré-linguisticos, pre-especulares, são objetos não representáveis, do registro real, parte de gozo que não poderá ser dita.
Estes "órgãos de gozo, o objeto a, por surgir de uma angústia transfenomênica, constituinte, não se inscrevem em estágios de desenvolvimento; antes, surgem primariamente e de modo sincrônico" (11).
Objeto a, que surge antes da incidência do Outro, objeto perdido, separado não mais pela castração nem pela lei, o ponto central é que esse órgão libido é isolado por efeito de uma perda natural. A estrutura real do objeto a é topológica, continua, não orientável, sincrônica.
Segundo Miller, este "objeto nada" da pulsão pode, em um segundo momento, se encarnar, se materializar "capturando diversas matérias sutis que foram isoladas sob quatro ou cinco aspectos diferentes. Para Lacan , antes de tudo, o objeto a é capturado por sua topologia ideal, e não deve ser confundido com o que lhe serve para cumprir seu percurso" (12) Aos objetos freudianos, oral e anal, Lacan acrescenta os objetos olhar e voz. Em Lacan são quatro modalidades do objeto diferentes: seio, fezes, olhar e voz, em relação às zona erógenas: boca, anus, olho e orelha, o corpo erógeno.
Os novos objetos teorizados por Lacan, olhar e voz, são inventados, a partir da psicose onde o olhar e a voz alucinados, excluídos do campo perceptivo retornam. Na neurose encontram-se presentificados no sentimento de estranheza, sendo que o seio e o excremento adquirem relevância como objetos das demanda.
Em relação à pulsão escópica cujo objeto é o olhar, Lacan a partir da obra de M.Ponty, O visível e o invisível, explicita que "um dado a ver preexiste ao visto", existe uma anterioridade, visão prévia do Outro sobre o sujeito. No seminário Os nomes do Pai, Lacan argumenta que o espetáculo captura ao sujeito, mais que este se engana na imagem especular i(a), o objeto agalma, no qual o sujeito acredita ser causa de seu desejo desconhecendo o verdadeiro a , o qual como nada, não pode ser nomeado, nem pode-se ver. Miller acrescenta que o fundamental na pulsão escópica é "desembaraçar o escópico do especular" já que a imagem, a forma e a beleza velam a castração.
O olhar encontra-se no campo do Outro, "o espetáculo do mundo é dado a ver" ao sujeito mas ele mesmo é dado a ver ao Outro. Na pulsão escópica do que se trata é de "se fazer olhar" naquilo que não se pode ver, que é impossível ver.
O objeto olhar "desespera o olho, indica-lhe que não vê tudo...." objeto mascarado pela relação especular onde o "sujeito faz a experiência de ver-se vendo-se...O olhar é produzido pelo esvaziamento na visão de tudo o que é capaz de fazer imagem"(13). Uma esquize entre o olho e o olhar produzida pela falta constitutiva, esquize presente no campo escópico. Esquize entre o que é olhado no campo da representação "e aquilo que escorrega, que passa".O quadro Os embaixadores pode exemplificar esta esquize, onde olhando a caveira, desde um certo ponto só, olhamos sem ver, já que o objeto a do vazio, do nada, não pode ser visto.
Na perversão o objeto a encontra-se do lado do sujeito, mas onde não pode vê-lo, lugar de desconhecimento.
Por ultimo a voz, "esse objeto quase incorpóreo, que não pertence ao registro sonoro" (14), a voz "é a própria da cadeia significante desenvolvendo-se como voz, é o próprio significante falando...como tal, é inaudível, não é da ordem da audição" (15). Lacan considera o objeto voz como essencial, caído do Outro como produto, objeto caído do órgão da palavra, onde o Outro é o lugar onde isso fala.
Assim como na pulsão escópica, na pulsão invocante as palavras podem também mascarar o vazio que as origina.
Concluindo, numa ultima articulação, situamos certo paradoxo na conceitualização (já colocado por Miller na sua Introdução à Leitura do Seminário da Angústia de
J. Lacan) do objeto a como resto irredutível ao Outro mas que ao mesmo tempo depende dele; incluído no Outro mas diferente do significante. É o esforço por articular a morte e a vida, o significante e o gozo. Será numa nova perspectiva que Lacan produzirá um Além, no seminário Mais Ainda, introduzirá o significante como causa de gozo, que incide sobre o corpo como sintoma, "en este sentido, el sintoma va más allá del fantasma, porque el fantasma supone el cuerpo mortificado por el significante, mientras que el sintoma, se refiere al cuerpo vivificado" (16), assim o significante produziria o plus de gozar. Nesta nova perspectiva a morte-significante, fragmentando e desorganizando introduziria vida para o sujeito, plus de gozar.
NOTAS
1 LACAN, Jacques. "Posição do Inconsciente". In: Escritos. Jorge Zahar Editor,1998, p.863.
2 LACAN, Jacques. "O sujeito e o Outro (I):A Alienação". In: O Seminário Livro 11 Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise. Jorge Zahar Editor, 1998, p.195.
3 IDEM
4 LACAN, Jacques. "Posição do Inconsciente". In: Escritos. Jorge Zahar Editor,1998, p.856
5 IDEM, p. 857.
6 NAHAS, Vanessa. "Capítulo IV, A operação de separação". In: Alienação e Separação: a dupla causação do sujeito. Dissertação de mestrado. UFSC 1998, p. 108.
7 ZELIS, Mariana. "Percurso conceitual da pulsão de Freud a Lacan". In: Jornada do curso de formação 1º Ano. Novembro 2004, p.13.
8 LACAN, Jacques. "O sujeito e o Outro (I):A Alienação". In: O Seminário Livro 11 Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise. Jorge Zahar Editor, 1998.
9 LACAN, Jacques. "Posição do Inconsciente". In: Escritos. Jorge Zahar Editor,1998, p.859.
10 MILLER, Jacques-Alain. "Introdução à leitura do Seminário da Angústia de Jacques Lacan." In: Opção Lacaniana, numero 43. Maio 2005.
11 RIAVIZ, Eduardo. "Angustia Lacaniana e hipermodernidade" . In: Atas do III colóquio da EBP, Delegação Santa Catarina e Paraná. Outubro 2005, p.20.
12 MILLER, Jacques-Alain. "Lição 22". In: Silet, Os paradoxos da pulsão de Freud a Lacan. Jorge Zahar Editor, 2005, p.327.
13 LEGIL, François. "Lembra-se do objeto que vimos, minha alma..." In: Os destinos da pulsão. Kalimeros, 1997, p.311.
14 IDEM
15 MILLER, Jacques-Alain. "Lição 17". In: Silet, Os paradoxos da plusão de Freud a Lacan. Jorge Zahar Editor, 2005, p.257.
16 MILLER, Jacques-Alain. "Dos". In: El hueso de um análisis. Tres Haches, 1998, p.53, 54.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
-DE CASTRO VELLOSO NETTO, Helvídeo. As pulsões, palavras ditas e não escutadas. Eleoterio.
-FELDESTEIN, Richard e outros autores. Para ler o seminario 11 de Lacan. Jorge Zahar Ed.1997.
-FREUD, Sigmund. "Lo siniestro". In: Obras completas. Tomo III.Editorial El Ateneo, 2003.
__________ "Más allá del principio del placer". In: Obras Completas. Tomo IIIl El Ateneo, 2003.
-GARCIA ROZA, Luiz Alfredo. O mal radical em Freud. Jorge Zahar Editor, 2004.Quinta edição.
-GARCIA ROZA, Luiz Alfredo. Acaso e repetição em psicanálise. Jorge Zahar Editor, 2003.
-LACAN, Jacques."Introducción a los nombres del padre" In:De los nombres del padre. Paidos 2005.
-NOMINÉ, Bernard. El marco del fantasma y el lienzo de la identificación. Transcripción Del seminário de San sebastian 1990-91
-RUDGE, Ana Maria. Pulsão e linguajem. Jorge Zahar Editor, 1998.
-SCHEINKMAN,Daniela. Da pulsão escópica ao olhar. Imago, 1995.
-YORKE, RECHARDT, e outros. A pulsão de morte. Editora Escuta, 1988.
-ZBRUN, Mirta Ana. Lacan e o campo do gozo. Livraria e editora Revinter, 1999.